Crise econômica faz imigrantes desistirem de morar na Espanha

Lad.Porto Geral com R 25 de marçoA crise econômica da Espanha afugenta a população estrangeira, que volta para seus países de origem ou decide fazer uma nova migração por falta de trabalho e oportunidades. Segundo o Instituto Nacional de Estatísticas, viviam na Espanha cerca de 5,7 milhões de imigrantes no início de 2012 - 15,2 mil a menos que um ano antes. Essa foi a primeira vez em 15 anos que o número de estrangeiros residentes no país diminuiu.

Não só imigrantes deixam o país. Dados do governo indicam que a população espanhola vivendo no exterior aumentou 6,3% entre 2011 e 2012. No Brasil, as autorizações de trabalho concedidas a espanhóis aumentaram 86,5% nos últimos três anos.

 Sajid nasceu na Caxemira, no norte da Índia, e há oito anos decidiu migrar para a Espanha em busca de melhores oportunidades de trabalho. Durante seus primeiros anos em território espanhol, trabalhou em uma multinacional, atuando de acordo com sua formação em engenharia mecânica. Depois de quatro anos, no entanto, sua situação no país mudou completamente. Vítima de uma demissão em massa, Sajid se viu sem emprego.

Decidiu, então, fazer um curso de seis meses para tirar a permissão para ser taxista, sua atual atividade. "Nos últimos anos passei mal aqui. A indústria parou, não tem construção civil, então também não tem nada", afirmou Sajid, pedindo para seu sobrenome não ser revelado. Segundo ele, há melhores oportunidades agora em sua terra. A Caxemira é famosa pela produção de tecidos - como a famosa lã -, mas a região há décadas está dividida entre o Paquistão e a Índia, sendo considerada uma área de conflito. "Mesmo com alguns problemas, me parece que a Caxemira está melhor do que aqui e lá eu ao menos tenho minha família", explica o taxista.

Sajid é um exemplo de um movimento que tem ganhado força na Espanha. O declínio da população estrangeira, que volta para sua terra de origem ou decide fazer uma nova migração, começou a se destacar nas estatísticas do país no ano passado. E a região autônoma de Madri tem sido a grande protagonista desse movimento. Segundo dados oficiais recentemente divulgados, a Comunidade Autônoma de Madri encerrou o ano de 2012 com 1.000.108 estrangeiros registrados, o que representou uma queda de 47.066 pessoas, o maior declínio dentre as 17 regiões espanholas.

Esse foi o terceiro ano consecutivo de queda no número de imigrantes que vivem em Madri. Os resultados podem ser explicados por três fatores: o menor número de chegadas ao país, o aumento das saídas e a aceleração das nacionalizações. Segundo afirmou o conselheiro de Assuntos Sociais da Comunidade de Madri, Jesús Fermosel, durante a divulgação dos dados, é verdade que houve um aumento nas concessões de nacionalidade espanhola para estrangeiros (o que os retira das estatísticas de imigrantes), mas muitos decidiram "encerrar seu projeto na Espanha, diante da situação econômica e de emprego do país".

Para o país como um todo, as últimas estatísticas também são um marco: segundo revelou em janeiro o órgão oficial Instituto Nacional de Estatísticas, viviam na Espanha cerca de 5,7 milhões de imigrantes no início de 2012, 15,2 mil menos do que um ano antes. Essa foi a primeira vez em 15 anos que o número de estrangeiros residentes no país teve queda.

"A explicação para isso é simples e chama-se recessão, com forte desemprego", afirmou o professor de sociologia e especialista em imigração da Universidade Complutense de Madri, Lorenzo Cachón. Segundo ele, a Espanha sempre foi um país de imigração porque havia no país demanda por força de trabalho. O setor típico de entrada para os homens estrangeiros era o de construção civil, a primeira indústria a ser paralisada pela crise. Hoje, 35% dos imigrantes que querem trabalhar na Espanha não encontram emprego, de acordo com as estatísticas oficiais do país.

Para o professor, os imigrantes são mais vulneráveis em momentos de crise. Além de serem atraídos por atividades mais sensíveis aos ciclos econômicos- como construção e indústria -, eles são os mais presentes nas estatísticas de contratos temporários, os trabalhadores que ficam menos tempo no mesmo emprego, e os que mais sofrem demissões ou são tratados com discriminação em momentos de recessão. Além disso, muitos têm baixo nível de educação, principalmente os jovens.

As diferenças de acesso ao sistema de proteção social também fazem com que os imigrantes sejam mais vulneráveis à crise na Espanha. No fim do ano passado, por exemplo, uma medida do governo central da Espanha causou polêmica. Em meio à série de cortes nos gastos públicos, o governo decidiu que os imigrantes sem permissão para residir ou trabalhar na Espanha não poderiam mais ser atendidos pelos hospitais públicos. Há mais de 150 mil pessoas vivendo nessas condições no país e, desde então, seus arquivos desapareceram do sistema púbico de saúde na maior parte regiões da Espanha, como Madri, que acataram a decisão das autoridades centrais.

Nas estatísticas, fica claro que a melhora nas condições de vida e oportunidades nos países emergentes tem atraído os imigrantes que vivem na Espanha. Em Madri, os equatorianos representam a terceira maior nacionalidade dentre os estrangeiros, depois dos romenos e marroquinos. Eles bateram o recorde de saída no ano passado: quase 20 mil pessoas foram embora da Comunidade.

O retorno para casa foi tão maciço que, em visita à Espanha no início deste ano, o ministro das Relações Exteriores do Equador, Ricardo Patiño, demonstrou preocupação com a chegada de tantas pessoas ao país. Em entrevista à agência de notícias EFE, ele afirmou que o Equador melhorou muito nos últimos anos e está em condições de acolher os imigrantes que retornam, mas "seria preferível que o retorno fosse ordenado". A Colômbia ocupa a quarta posição no ranking da maior população imigrante em Madri e representou a segunda maior saída: quase 8.000 colombianos arrumaram suas malas e saíram da Espanha.

Apesar de diminuir as pressões sobre o emprego no país, a saída dos imigrantes da Espanha, segundo Cachón, pode acelerar os impactos da crise econômica, já que acentua o esfriamento do consumo. "Nos últimos anos, nós crescemos também devido ao consumo interno. O número de consumidores vivendo no país é importante", afirma.

As consequências disso geralmente não são maiores porque o imigrante que deixa o país já não estava mais em condições de consumir muito. Outro efeito dessas saídas se dá na estrutura demográfica da Espanha. Quase 30% da população estrangeira que vive em Madri está entre 30 e 40 anos, em plena idade ativa de trabalho e, com o egresso dessas pessoas, o problema do envelhecimento da população espanhola se agrava. "Em alguns anos seremos o país mais envelhecido da União Europeia [UE]", explica o professor.

Mesmo que a crise esteja expulsando os imigrantes da Espanha, em números absolutos o país continua classificado no topo do ranking de imigração da UE. Segundo os dados mais recentes da Eurostat, a agência oficial europeia de estatísticas, em 2011, a Espanha era o segundo país com o maior número de imigrantes do bloco, atrás apenas da Alemanha. Em 2001, chegou a haver um aumento de quase 50% na população de imigrantes no país. "A Espanha continua sendo um país de imigrantes. Mas em cinco ou dez anos é difícil que o fluxo seja importante. As pessoas vão continuar a deixar o país e poucas vão entrar", afirma Cachón.

Enquanto isso, Sajid começa a se preparar para arrumar as malas e deixar a experiência de oito anos na Espanha para trás. "Aqui não dá mais para ficar", conclui.


Por Vanessa Dezem | Para o Valor, de Madri

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